Começo por confessar que não tenho hábito de ver cinema português. Tabu foi-me aconselhado como um filme de alta qualidade, do melhor que se fez em 2012.
O filme tem duas partes muito distintas entre si e que correspondem aproximadamente a duas metades das quase duas horas de filme.
A primeira - "Paraíso perdido" - segue a vida de Pilar e Aurora, duas vizinhas, não só de rua mas também numa certa sensação de solidão. Pilar é uma mulher insistentemente mostrada como boa pessoa, amiga e preocupada com os outros, mas que vive só e cujo aparente interesse amoroso lhe interessa francamente pouco - de uma piedade católica dolorosa. Aurora é a sua vizinha, mais velha, que vive com a sua empregada Santa e abandonada pela filha que terá emigrado para o Canadá. Se inicialmente a história nos é mostrada do ponto de vista de Pilar, vai-se percebendo que o real mistério a ser explorado no filme pertence ao passado de Aurora, que ainda hoje a apoquenta. Esta primeira parte peca por ser lenta demais. Há momentos em que se torna quase uma tortura o silêncio inactivo e consecutivo ao longo de quase uma hora. Mas, se aguentarmos, chegamos ao momento final, em que nos é revelado o motivo pelo qual houve esta introdução, na comparação entre a boa pessoa, injustamente solitária e a culpada, que se sente a pagar penitência por erros passados. Pilar vai ao encontro de um suposto velho amigo de Aurora e é ele, Ventura, que passa a ser o narrador, introduzindo a segunda parte do filme - "Paraíso".
Aqui vemos a juventude de Aurora, a adopção do crocodilo, o seu casamento, gravidez, a relação com Ventura, os seus pecados e a forma como acabaram ambos em Portugal. A segunda parte é substancialmente melhor que a anterior, e, embora não lhe note a genialidade que outras criticas lhe conferem, justifica bem a hora que lhe é dedicada e o tempo que se perdeu à espera dela. O narrador funciona muito bem, a fotografia é fenomenal, os silêncios são naturais, a ligação ao início da guerra colonial fornece-lhe um contexto interessante e o crocodilo como testemunha dá-lhe uma certa graça. Se as as actrizes tinham estado óptimas em "Paraíso perdido", não há nada a apontar aos protagonistas de "Paraíso". O enredo, no entanto, (SPOILERS) não passa de um amor proibido entre a mulher casada e o amigo da família, ainda por cima baterista de uma banda, que a leva a atitudes de que ambos se arrependem para o resto das suas vidas.
Logo pelo título das duas partes, que mostra a diferença entre a vida boa de Aurora na juventude em Moçambique e a penitência da sua velhice em Portugal, percebe-se que este é um filme pejado de simbologia. A filmagem a preto e branco, os silêncios contemplativos, a introdução, o crocodilo, a descrição do sonho de Aurora, houve um enorme investimento nos símbolos, de certa forma afogando o que resta de filme.
Aquilo que se torna o seu pior problema é, no entanto, a duração da primeira parte. A mesma mensagem poderia ter sido passada em metade do tempo, dando-lhe uma progressão que não sendo rápida ao ponto de perder a sensação de solidão e melancolia, deixaria de ser lenta ao ponto de se tornar soporífera. É um defeito comum no cinema português, do que eu conheço dele.
A primeira - "Paraíso perdido" - segue a vida de Pilar e Aurora, duas vizinhas, não só de rua mas também numa certa sensação de solidão. Pilar é uma mulher insistentemente mostrada como boa pessoa, amiga e preocupada com os outros, mas que vive só e cujo aparente interesse amoroso lhe interessa francamente pouco - de uma piedade católica dolorosa. Aurora é a sua vizinha, mais velha, que vive com a sua empregada Santa e abandonada pela filha que terá emigrado para o Canadá. Se inicialmente a história nos é mostrada do ponto de vista de Pilar, vai-se percebendo que o real mistério a ser explorado no filme pertence ao passado de Aurora, que ainda hoje a apoquenta. Esta primeira parte peca por ser lenta demais. Há momentos em que se torna quase uma tortura o silêncio inactivo e consecutivo ao longo de quase uma hora. Mas, se aguentarmos, chegamos ao momento final, em que nos é revelado o motivo pelo qual houve esta introdução, na comparação entre a boa pessoa, injustamente solitária e a culpada, que se sente a pagar penitência por erros passados. Pilar vai ao encontro de um suposto velho amigo de Aurora e é ele, Ventura, que passa a ser o narrador, introduzindo a segunda parte do filme - "Paraíso".
Aqui vemos a juventude de Aurora, a adopção do crocodilo, o seu casamento, gravidez, a relação com Ventura, os seus pecados e a forma como acabaram ambos em Portugal. A segunda parte é substancialmente melhor que a anterior, e, embora não lhe note a genialidade que outras criticas lhe conferem, justifica bem a hora que lhe é dedicada e o tempo que se perdeu à espera dela. O narrador funciona muito bem, a fotografia é fenomenal, os silêncios são naturais, a ligação ao início da guerra colonial fornece-lhe um contexto interessante e o crocodilo como testemunha dá-lhe uma certa graça. Se as as actrizes tinham estado óptimas em "Paraíso perdido", não há nada a apontar aos protagonistas de "Paraíso". O enredo, no entanto, (SPOILERS) não passa de um amor proibido entre a mulher casada e o amigo da família, ainda por cima baterista de uma banda, que a leva a atitudes de que ambos se arrependem para o resto das suas vidas.
Logo pelo título das duas partes, que mostra a diferença entre a vida boa de Aurora na juventude em Moçambique e a penitência da sua velhice em Portugal, percebe-se que este é um filme pejado de simbologia. A filmagem a preto e branco, os silêncios contemplativos, a introdução, o crocodilo, a descrição do sonho de Aurora, houve um enorme investimento nos símbolos, de certa forma afogando o que resta de filme.
Aquilo que se torna o seu pior problema é, no entanto, a duração da primeira parte. A mesma mensagem poderia ter sido passada em metade do tempo, dando-lhe uma progressão que não sendo rápida ao ponto de perder a sensação de solidão e melancolia, deixaria de ser lenta ao ponto de se tornar soporífera. É um defeito comum no cinema português, do que eu conheço dele.
Acaba por tudo isto por ser um filme que será aproveitado ao máximo e adorado por uma minoria do grande público, já cansada do cinema anglo-saxónico mainstream e preparada para uma obra que tem um pendor intelectual bem introduzido no enredo embora não muito elaborado ou surpreendente e sem grande investimento no entretenimento. Vale a pena ver, mas sem grandes expectativas e com uma certa preparação mental.
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I'm not used to watching Portuguese films, but Tabu was recommended as one of the best films in 2012 so I decided to give it a chance.
Tabu has two very distinct main parts, roughly one hour each. The first - "Paradise lost" - follows Pilar and Aurora, two neighbours who share not only the location but also a certain feeling of solitude. Pilar is persistently shown as a good person, friendly and worried about others, living alone, with little interest in her supposed love interest - a painful catholic piety through and through. Aurora is her elder neighbour, lives with Santa - the maid - having been apparently abandoned by her daughter who has moved to Canada. The story is initially told from Pilar's point of view, but one eventually understands that it's Aurora's troublesome past that will end up being explored in the rest of the film. This first part is by far too slow, with some of the consecutive silent moments becoming almost torture. If one keeps watching though, the purpose of this first part is revealed, in the comparison between the good woman, whose solitude is unfair, and the guilty one, who feels she is paying for her sins. Eventually Pilar looks for Aurora's long lost friend, Ventura, who becomes the narrator for the second part of the film: "Paradise".
Here we get to watch Aurora's youth, the adoption of the crocodile, her marriage, pregnancy, her relationship with Ventura, her sins and how they both ended up living separately in Portugal. This second part is much better than the first and, though far from being ingenious as I've read on other reviews, it does deserve it's duration and how much one waited for it. The narrator works really well, the photography is astonishing, the silences are natural, the connection with the beginning of the colonial war gives it an interesting context and the crocodile as witness comes as a funny but not goofy detail. If the actresses were great in "Paradise lost", the main actor and actress in "Paradise" were also flawless. The plot, though, (SPOILERS) is nothing but the typical forbidden love between the married woman and the friend of the family and drummer in a band, which eventually leads to some actions - mainly hers - that both regret for the rest of their lives.
This is a film fraught with symbols, from the names of the parts - showing the difference between her good life in Mozambique and the penitence of her old age in Portugal - and the black and white image to the contemplative silences, the introduction, the crocodile, Aurora's dream. The investment in symbology is so much it drowns the rest of the film.
Despite what I just said, the worst part of Tabu is, undoubtedly, the length of the first part. The same message could have been delivered in half the time, giving it the pacing it needed, not too quick that it lost the feeling of loneliness and melancholy but also not as slow, becoming quite soporific. From what I've seen, the slow pacing and exaggerated use of silence are common problems in Portuguese cinema.
For all this, Tabu ends up being a film to be truly enjoyed by few, tired of the mainstream Anglo-Saxonic cinema and prepared for a quite intellectual tendency, nicely woven into the plot though not deeply worked or really surprising, and little investment in entertainment. It's worth watching, though one should avoid high expectations and be on the right mindset.
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