Sunday, 30 June 2013

The Inner City by Karen Heuler

Mais um livro que tive oportunidade de ler através da NetGalley, desta feita uma aposta às cegas, dado que desconhecia a autora e a descrição era apenas indicativa de que estava prestes a ler ficção curta especulativa. A aposta foi, sem dúvida, ganha. Embora, como é inevitável nestas antologias, haja contos que goste mais e outros que goste menos, no computo geral a leitura foi interessante, com algumas ideias originais e uma abordagem diferente daquilo a que estou habituado.
Karen Heuler diz na sua página que escreve realismo mágico, instigada a isso pela leitura de Gabriel García Márquez, e de facto vejo a proximidade entre algumas das suas histórias e o pouco que li de Haruki Murakami, outro autor associado a este género literário. Apesar de tudo, não consigo escapar à impressão que isto não passa de mais um filho da ficção especulativa, do fantástico, com um isolamento da fantasia ou ficção científica e uma aproximação à chamada ficção literária provavelmente mais por motivos comerciais do que pelas características intrínsecas da obra.
Comentário aparte, como antologia de contos sejam de ficção especulativa sejam de realismo mágico, The Inner City é um trabalho interessante que permite uma exploração da reacção do indivíduo a uma série de situações caricatas - por vezes absolutamente surreais - e que terminam quase sempre numa nota auto-analítica, em tom de descoberta ou de transformação do sujeito. Os enredos, esses são de uma multiplicidade e heterogeneidade que só se compreende sabendo que os quinze contos foram publicados separadamente entre 1997 e 2011. Desde crianças que se transformam em animais, híbridos genéticos de humano e cão criados para serem servis a pessoas que nascem da terra como plantas mas já adultos, vestidos e com intenções bem definidas e outras que se tornam parte de um oceano alienígena que mais parece um sincício, tudo pode acontecer nas obras de Karen Heuler. Tocando em temáticas como a experimentação biológica e genética, a ecologia, a religião e a engenharia social, a novidade aqui reside principalmente na naturalidade com que a maioria das personagens encaram estes fenómenos, o que permite à autora guiar o leitor por caminhos inesperados. O foco recai sempre sobre uma pessoa, a sua visão dos acontecimentos, a sua participação neles ou comportamento perante eles e aquilo em que a pessoa se torna ou que descobre ser, algo que de certa forma se aproxima de Kafka ou mesmo Camus. Há constantemente um interpelação à mente do leitor, a quem são mostradas realidades que dificilmente não o farão questionar o seu conceito de pessoa, de sociedade, de humanidade ou de moralidade.
Uma obra recomendada a quem gostar de ficção curta especulativa. Fico com vontade de ler algo mais desta autora, venham daí as sugestões.


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Another book I had the opportunity to read through NetGalley, and this time a blind bet, considering I didn't even know the author and the description wasn't really specific. No regrets. Though, as is unavoidable in anthologies, there were some stories I liked much more than others, in general the book was very interesting, with some original ideas and approaches different from what I'm used to.
On her website, Karen Heuler says she writes magic realism, lead there by reading Gabriel García Márquez, and I do see some similarity between some of her stories and the little I've read of Haruki Murakami, other author associated with this genre. I still can't move past my feeling that this is but another part of speculative fiction isolated from science fiction and fantasy and associated with literary fiction for commercial reasons.
Side note apart, as an anthology of short tales - be them whatever genre one says - The Inner City is an interesting work that allows for an exploration of the individual's reaction to some odd situations - often quite surreal - which end in a self-analytical tone. The plots are of such an heterogeneity that one can only understand it knowing that they were published separately between 1997 and 2011. From kids that turn into animals, human-dog hybrids to people born from the ground like plants (though adult, dressed and decided) and others that become part of an alien ocean that reminded me of a syncytium, anything can happen in the works of Karen Heuler. Addressing themes such as bio-genetic experimentation, ecology, religion and social engineering, what's new here is the simple and natural way in which characters deal with the awkward situations, allowing the author to lead the reader through unexpected paths. The focus is always on the person, her vision of the phenomena, her participation in or behaviour facing them and what she turns into or finds out about herself, creating a narrative that reminds me of Kafka or even Camus. The reader is shown realities that constantly question his concept of person, of society, of humanity or morality.
A recommended work to all those who enjoy speculative short fiction. I now want to read more of this author, any suggestions?

Friday, 28 June 2013

Cats



After reading a post on Brain Pickings on A Cat-Hater’s Handbook, I decided I'd come and talk about my cats but because now I don't feel like talking at all - I'll end up complaining too much of all the destruction they are causing - I'll just show some pictures of them.

They are called Thor and Loki and this has been their (almost complete) first year, one I'll probably remember as my home's ragnarok. Enjoy :)

The last one was taken two days ago, under this surprising and overwhelming heat wave we're experiencing here, which makes them sleep all day or at least be generally even lazier than usual (not during the night, sadly).




And now I'll leave you with this other awesome  Brain Pickings post:
T. S. Eliot’s Iconic Vintage Verses About Cats, Illustrated and Signed by Edward Gorey

Sunday, 23 June 2013

Montaro Caine by Sidney Poitier

Descobri Montaro Caine no NetGalley e fiz a requisição porque fiquei curioso, não só por ser do Sidney Poitier, mas também pela descrição. O livro é, no fundo, a vida do Montaro Caine, um CEO de uma empresa mineira e de engenharia química, no início do enredo aparentemente prestes a perder o controlo da empresa. À medida que a história é contada, vamos percebendo que Montaro é uma pessoa atípica, com uma infância complicada e que vê o avô não só como uma figura paternal mas como uma espécie de guia. Simultaneamente desenvolve-se o enredo aparentemente paralelo onde uma criança nasce com uma moeda na mão. É esta história que nos mostra que estamos perante ficção especulativa e que me foi mantendo o interesse na leitura. Ao longo do livro Montaro vê-se perante uma situação complicada, que envolve não só esta moeda com materiais desconhecidos e aparecimento no mínimo misterioso, como coleccionadores milionários, burlões, família e até pessoas do seu próprio passado. Claro que no final todas as pontas soltas misteriosas se ligam numa revelação que tem como centro, mas não como único foco, o próprio Montaro Caine.
A personagem principal está bem desenvolvida, as suas motivações e decisões, as interacções com a família, com a empresa na situação habitual, com empregados, com desconhecidos, as suas imperfeições e o seu carácter, tudo parece fazer sentido e raramente é forçado para dar jeito ao enredo. O resto das personagens raramente são tão bem desenvolvidas e são essencialmente o suporte para a história, embora haja alguns bons momentos.
Infelizmente acaba aqui aquilo que o livro teve de interessante para mim. A questão da moeda acabou por se revelar de certa forma previsível, com uma aproximação à ficção científica pouco aprofundada ou original. O final do enredo foi prejudicado essencialmente por querer dar o palco ao grande defeito do livro, a mensagem paternalista de auto-confiança, esperança, trabalho e união que o autor quis passar à força. Não que a mensagem seja má per se, mas a forma como foi sendo "martelada" ao longo de toda a história torna a leitura por vezes irritante. As conversas com o avô são um exemplo disso. Montaro vem com dúvidas práticas e pragmáticas, o avô limita-se a dizer-lhe que confie em si (de várias maneiras diferentes) e o neto quase magicamente acaba por arranjar soluções. A leitura aproxima-se em certos momentos da de livros de Paulo Coelho, ou do que suponho seja a sensação de ler O Segredo e é tanto melhor quanto mais se afasta disso.
Há nesta obra uma ideia positiva, que é a de que perante oportunidades de crescimento e progresso (aqui representadas pela moeda, pelo conhecimento, pela ciência) devemos tentar unirmo-nos e trabalhar em conjunto para esse fim. No entanto o facto do autor pregar estas ideias em vez de as demonstrar e de as associar a um certo efeito mágico da motivação e da esperança estraga o que poderia ser, conceptualmente, uma história interessante. Fica assim uma leitura aceitável que agradará a quem gostar de ver explorada a vertente do negócio, do bluff, da forma como os interesses de uns e outros vão sendo jogados por uns e outros, cada um centrado na sua vontade e com um protagonista bem conseguido, mas que ficará à quem das expectativas de leitores mais experimentados, especialmente na ficção científica, e que desaconselho sem reservas a quem não suporta narradores-pregadores.

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I found Montaro Caine at NetGalley and decided to request it not only because of the author but because the description enticed me. The book is, bottom-line, the story of Montaro Caine's life, the CEO of a mining-chemistry corporation apparently on the verge of loosing its control. As the tale is told, we start to understand Montaro as an atypical individual, with a complicated youth and a grandfather who he sees not only as a father-figure but as a true guide. Simultaneously, the apparently parallel plot starts to be developed, as we read about a child who is born with a coin in her hand. This is what shows we are about to read some sort of speculative fiction and also what made me curious enough to keep reading. Eventually, as Montaro and this coin with impossible materials become more connected, he is lead into some complicated situations all at once, be it negotiations with millionaire collectors, scams and troubles with his family and even the return of people and stories from his own past. Of course all these loose ends come together at an ending that is centred around Montaro, but not at all solely focused on him.
Montaro is a well developed character, with fleshed out motives and decisions, character and imperfections, and interesting interactions with the company, his employees, his family, where he makes sense without seeming too pushed into stuff just for the sake of the plot.
Unfortunately this is all that's good with this book. The issue with the mysterious coin ends up being quite predictable in a very superficial and far from original approach to science fiction. The ending was ruined because it gave centre stage to the worst of this novel, the preaching. The author is quite paternalistic in the way he conveys his message of self-confidence, hope, union and effort, and at times gets close to what Paulo Coelho does on his books (and also, I imagine, to what the Secret has to say). The book is at its best when the author escapes from those moments. One example of what annoyed me is his interaction with his grandfather. Montaro comes with a very objective doubt, a practical issue that he can't find the solution to, speaks with his grandfather who, in a lot of different ways, usually tells him to trust himself and eventually he comes up with a solution. Once this would be fine, everyone needs a confidence boost once in a while, but for this to be the means to solve problems seems to me quite stupid.
There is a very positive message in this novel, one that tells us that we should unite and work together towards our common progress, here conveyed by the coin and science as a means to the betterment of humanity. However, the fact that the author preaches this instead of showing and associates the message with the magical effect of hope and motivation spoils what could have been, at least conceptually, an interesting story. As it is, this is a passable read with a good protagonist which will please those who enjoy the negotiation, bluff and overall playing and taking advantage of each characters' interests but will be below the expectations of more experienced readers - specially in science fiction - and one that I thoroughly do not recommend for people who can't stand preaching narrators.

Friday, 21 June 2013

O que é natural é bom (não é?)

Decidi partilhar este artigo que encontrei via WTF, Evolution? para ilustrar o que eu sinto quando alguém me diz que algo é bom ou seguro porque é NATURAL.
Este anfíbio espreme a fêmea para ela libertar os ovos. Muitas vezes este processo leva à morte da fêmea. Mas isso não tem qualquer problema, porque a natureza - amiga que é - arranjou maneira de ela conseguir libertar os ovos mesmo depois de morta, pelo que consegue na mesma ter filhos.
Se quiserem saber mais, cliquem na imagem.




Da próxima vez que pensarem que algo é melhor por ser natural, que funciona com segurança por ser natural, que é correcto porque é natural e por aí fora, pensem nestes sapos da Amazónia.

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I decided to share this article I found via WTF, Evolution? to express what I feel when anyone tells me something is good or safe because it is NATURAL.
This amphibian squeezes the female in order for her to release the eggs. Many times the females end up crushed to death. But that's totally fine, because even dead, the female's body retains the ability to release viable eggs when squeezed.
If you want to know more, click the photo.




Next time you think something is better because it's natural, something works safely because it's natural, something is right because it's natural and all that, think instead of these amazonian frogs.



Photos by Domingos Rodrigues, shared on the article at The Scientist

Thursday, 20 June 2013

Afinal é coveiro desde pequenino

Cavaco Silva ADMITE (para usar o vocabulário dos noticiários) que já abriu dezenas de covas. Ora tendo sido ele nosso governante, isto não deve ser novidade para ninguém, mas achei por bem partilhar de qualquer forma, até porque assim deixa de se associar tal personagem com outras profissões (cujos representantes até já se queixaram). Será que também foram colossais, como os desvios dos outros? Se pelo menos tivesse plantado árvores na economia, talvez tivéssemos fruta em vez de apanharmos com a chuva das crises e austeridades. Para resolver este último problema recomenda trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, trabalho... Coisa que não há em lugar nenhum neste país. O que me faz pensar que o enterrou nos buracos que cavou. Sendo assim, se alguém souber do paradeiro das Covas de Cavaco, avisem o pessoal para irmos em busca do trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, que de preferência venha associado a emprego, emprego, emprego, emprego, emprego e que, em sociedades mais civilizadas, até traz uma bonificação a que chamam, por lá, salário, salário, salário, salário, salário.

Para ver mais (e rir mais, quiçá) visite-se a televisão pública na net.