Monday 19 November 2012

Steampunk and Clockwork Portugal or the story of where I've been all this time

Como acontece ciclicamente comigo, mais uma vez passei uma temporada sem produzir conteúdo para o blog. Não que não tenha o que dizer ou vontade de escrever no blog, mas porque o tempo é pouco, a capacidade de concentração é esgotada pelo trabalho e porque há novos projectos a ocupar o que resta de ambos. É disso que decidi falar desta feita, porque este ano tem sido marcado pela minha participação num projecto que envolveu outro blog, um tumblr, uma webseries e uma convenção: a Clockwork Portugal - uma comunidade portuguesa dedicada ao steampunk em todas as suas vertentes.

Nesse sentido, parece-me útil começar por falar do steampunk, mas não me proponho fazer uma definição absoluta ou uma listagem exaustiva do que a ele pertence, somente focar-me no que eu procuro ou no que me promete o steampunk. Apesar de ser fã de ficção especulativa, tanto na literatura como no cinema ou nos jogos, desconhecia o steampunk como género até há bem pouco tempo. Há no entanto elementos tipicamente explorados nos trabalhos que nele se inserem que me interessam particularmente, nomeadamente o impacto na sociedade do desenvolvimento tecnológico e a alteração dos valores e costumes sociais desenvolvida a partir de um contexto extremo como é o do mundo da revolução industrial, do império britânico vitoriano, do declínio do escravagismo, da emancipação da mulher, não só pelo interesse histórico autocrítico e pela exploração do que é ou tem sido a humanidade, mas também pelo paralelismo com o que vivo e vejo na sociedade contemporânea. Aquilo que torna o steampunk reconhecidamente distinto dos restantes tipos de ficção especulativa não é, no entanto, nada disto, mas sim o facto da tecnologia explorada ser a do vapor e das engrenagens. É talvez por esta característica que o steampunk é hoje muito conhecido, associando-se a um autêntico movimento estético, grupos de cosplayers e roleplayers (aqui também a importante influência da roupa e costumes da Inglaterra vitoriana, claro), desenho, pintura, jogos e até um revivalismo das máquinas a vapor ou a corda, das engrenagens visíveis, dos metais não pintados. É importante referir que isto ultrapassa o aspecto estético, havendo vários criadores que trabalham novamente com esta tecnologia para obter gadgets que funcionantes num espirito do-it-yourself que tem estado muito associado ao movimento steampunk. Uma das características importantes da tecnologia da era do vapor, que lhe permite ocupar este lugar de destaque, é o facto de se localizar claramente, do ponto de vista dos leigos, na distinção entre a ciência e a magia. Aliás, tal como Arthur C. Clarke disse no Profiles of the Future"any sufficiently advanced technology is indistinguishable from magic" e de facto nunca mais, desde ultrapassada a era do vapor, nós pudemos dizer que percebemos bem o funcionamento das máquinas das quais o nosso dia a dia e a nossa sociedade dependem. Talvez seja também por isso que nas obras steampunk se vê frequentemente um cruzamento entre a ficção científica e fantasia com feitiçaria, demónios ou monstros, normalmente em conflito uns com os outros. Sendo este um dos tais elementos que me estimula a procurar trabalhos deste género, o outro não menos importante é o facto de permitir explorar e questionar os costumes, a moral, o que é suposto ser ou fazer, o tradicional "tem que ser". O tal espírito autocrítico, de repensar a sociedade e a humanidade, em especial no que toca a estas temáticas, é algo que não só me interessa como me parece de especial utilidade na nossa evolução. Não chega saber a história, não chega aprender com o que aconteceu, é importante explorar bem os processos, o que levou a certo tipo de acontecimentos, a cada organização ou estratificação da sociedade, a certa definição do que está certo ou errado, do que é melhor ou pior, etc.. Só assim podemos ultrapassar os preconceitos estabelecidos que nos prendem e nos limitam o raciocínio e a acção sobre as pessoas e o mundo. A ficção especulativa de grande qualidade sempre teve esse papel, seja a ficção científica futurista ou espacial, seja a ficção histórica, seja a distópica, e neste contexto o steampunk tem um papel especial por se localizar temporalmente num momento da nossa história do qual conhecemos muito do que correu bem e mal, do que aconteceu antes, durante e depois, e acima de tudo, porque é muito claro o sistema de valores e moralidade vigente na altura o que torna mais fácil jogar com tudo isto ou tentar prever as consequências de alterar algum factor. Desde a igualdade de direitos entre os sexos e raças, da importância de cada indivíduo se submeter ao que a sociedade lhe força ou pelo contrário seguir o seu próprio caminho contra tudo o que é suposto, ao valor do e segurança no trabalho e à dependência crescente da sociedade de fontes de energia específicas e muito mais, são várias as situações que uma obra steampunk pode usar para nos dar food for thought. Claro que nenhuma obra trata tudo isto, e alguns livros supostamente steampunk fazem pouco mais que incluir um herói e um cientista maluco com máquinas a vapor, mas são estas possibilidades que me mantém interessado no género literário.

Explicado que está o meu gosto pelo steampunk como temática, percebe-se porque me senti aliciado a ajudar as minhas amigas com o seu projecto de criar uma comunidade steampunk portuguesa e preparar a participação do nosso país na EuroSteamCon, uma convenção internacional multicêntrica simultânea. Se inicialmente a minha oferta de ajuda foi algo genérica, acabei por me tornar parte integrante da equipa, junto com a Sofia Romualdo, a Joana Lima e o Rogério Ribeiro. A princípio a minha ideia era ajudar com o blog, escrever sobre livros, séries, jogos, notícias, mas de repente dei por mim a filmar uma webseries sobre obras steampunk (ver links abaixo) e a ficar responsável pelo tumblr onde partilhamos trabalhos que se integram no género. Como se isto não chegasse, ainda conseguimos decidir que a nossa participação na EuroSteamCon - ainda que a primeira e apesar da inexperiência da maior parte da equipa - seria uma convenção propriamente dita, com direito a dois dias de programação. Parece que isto chegaria para ocupar o que resta do nosso tempo livre (em especial considerando que a minha participação se cinge às horas livres após emprego oficial) e da nossa margem de manobra financeira (patrocínios em € = 0) mas na verdade não ficámos por aqui. Decidimos preparar para este momento um Almanaque Steampunk, para o qual aceitámos trabalhos submetidos por qualquer pessoa no final de Julho e primeira quinzena de Agosto. A escolha dos textos, preparação das nossas próprias participações, edição e afins tarefas ocuparam muito mais tempo e deram muito mais trabalho do que o que eu esperava (e lembrar que foi neste momento que, no contexto de fazer o trabalho de design para o almanaque, conseguimos mais uma colaboradora, a Joana Maltez), mas tenho que admitir que ter o livro na mão e depois lança-lo na convenção me deu uma sensação de realização pessoal raramente atingida noutras situações. A EuroSteamCon - Porto, que tivemos o prazer de realizar no Parnaso, foi um desses momentos: os convidados foram fenomenais, tivemos casa cheia nos dois dias e a interacção com as pessoas foi fantástica. Temos o hábito de falar do quanto "outras pessoas" conseguem fazer, de quantas coisas acontecem "noutro lugar" e de repente provámos a nós próprios que mesmo sem apoio monetário, mesmo a começar do nada, com esforço e dedicação algumas coisas são possíveis. Tenho que dizer claramente que não estou com isto a tentar glorificar o trabalho voluntário, aliás a minha experiência permite-me afirmar com facilidade que um projecto como este com pessoas remuneradas, com horas dedicadas e fundo de maneio correria ainda melhor, tanto para os organizadores como para os participantes. Mas olhando para o que conseguimos, para os projectos de que fiz parte ao longo deste ano, só posso sentir orgulho.

Para quem quiser saber mais sobre tudo isto:


 - Tumblr (o meu novo trabalho a tempo inteiro :)

 - Diários Steampunk (a tal webseries)

 - Almanaque Steampunk (ler, ler!)


Por fim, há mais um motivo para eu não ter tempo para escrever no blog: agora tenho dois gatos, um que dorme em cima de mim quando estou ao computador ou então tenta trepar cortinas e outro que só se estiver a dormir é que para de por a minha casa em perigo de precisar de um "Extreme Makeover".

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