Thursday, 22 May 2014

Apelo ao voto consciente e informado


Quem me conhece sabe que há pouco que me afecte tanto como a história de Auschwitz. Ver esta pessoa, neto de um dos homens mais odiados da história, ligado a este que é um dos piores momentos da humanidade, ter a coragem de dar a cara pelo apelo ao voto lembrou-me que isto nunca é suficiente.

Pelo meu envolvimento com o LIVRE, tenho andado na rua a distribuir informação e divulgar as nossas propostas para as eleições europeias. Infelizmente, ouço demasiadas vezes respostas como "não quero saber de política"; "os políticos são todos iguais"; "eu quero é comida e saúde, não me interessa votar"; "não quero dar tacho a ninguém"; "a política é uma falcatrua"; "isso é demasiado complicado para mim"; "eu vou lá, voto e venho embora, não preciso de pensar muito".
Por tudo isto, não posso deixar de dar o meu contributo, por menor que seja, no apelo ao voto. Não porque o voto é um direito, não porque lhe chamamos, muitas vezes no vazio, um dever de cidadania, mas porque votar é decidir, é contribuir para escolher quem vai governar, dentro do possível, uma parte muito importante da vida de todos nós, porque votar é fazer parte da democracia em vez de viver em paralelo a ela, como se nos fosse indiferente, porque votar sempre é a melhor maneira de ter a certeza que vamos poder continuar a votar, porque qualquer alternativa é pior.
Mas mais do que isso, apelo ao voto informado. Porque não é riscar um boletim que faz de nós cidadãos, é o processo de conhecer as alternativas, discuti-las, formá-las e no final escolher a que melhor nos representa, ainda que seja nenhuma das que há e votemos nulo.
A Daniela diz que este vídeo fala por si, que não é preciso escrever nada para o acompanhar. No fundo, concordo com ela. Mas não posso não falar. Porque me arrepia o que ouvi no vídeo, mas porque mais me arrepia a ideia de que a perda de credibilidade da democracia, pelo descrédito dos políticos como classe, nos pode estar a levar de volta a um caminho que já percorremos à custa de sangue que ainda não conseguimos lavar das mãos.
Ainda estou arrepiado.

Por favor, a todos nós, votem.




"Eu sei mais do que a maioria das pessoas acerca do desejo de esquecer. Houve tempos em que quis negar o meu passado, fingindo ser outra pessoa. Mas nunca devemos esquecer o nosso passado, por mais que ele nos doa. Quando esquecemos, a história repete-se. Eu temo que isto esteja a acontecer neste momento. Por toda a Europa, os partidos de extrema-direita, estão a ganhar terreno. Se nós não fizermos nada é porque não aprendemos nada. O meu nome é Rainer Höss, neto de Rudolf Höss, o comandante nazi do campo de extermínio de Auschwitz. A minha história ensinou-me que Democracia, Igualdade e Direitos Humanos, nunca podem ser dados como certos. Nunca se esqueçam de votar."

Monday, 5 May 2014

É a bida, Bidarra

Não tenho por hábito escrever respostas directas a coisas destas, em especial quando não me são dirigidas, mas às vezes não consigo evitar. Um Sr. Pedro Bidarra publicou há dias um texto no Dinheiro Vivo que foi de uma falta de senso que me recorda alguns esforços dos Henriques no Expresso.

Em referência a uma crónica do Rui Tavares no Público sobre a "mesmocracia", começa por dizer que lhe parece que a inovação e a criatividade estão há muito na clandestinidade, no que toca a Portugal. Pergunto-me onde foi buscar esta ideia. Um país que há meio século era um buraco e conseguiu não só escapar da ditadura como aproximar-se de países que tinham décadas de desenvolvimento de vantagem, unir-se a eles na união europeia, competir com eles a nível de alguns produtos, a nível científico, a nível cultural. Um país onde até a nível de legislação se inova, sendo dos pioneiros na abordagem de coisas como a redução de riscos na toxicodependência ou na igualdade de género. Bem, fica por explicar.
Segue para uma citação mal amanhada para nos informar que somos um país com uma enorme quantidade de imbecis. "Parece-me mesmo que, para se chegar à elite, é precisa uma razoável dose de imbecilidade, ou seja, de pensamento convencional, de saber fazer o que sempre se fez, de falar como sempre se falou, de pensar o que sempre se pensou." Então que elites serão estas, tão mais imbecis que as dos restantes países? E justificação para esta classificação, nem vê-la, a não ser que o próprio texto seja amostra que chegue.
Calma que o Pedro Bidarra afinal dá exemplos. Passando ao lado dos empresários e capitalistas, identifica as direcções das TV como imbecis por exemplo por terem todos programas de comentário desportivo semelhantes. "Diz ele que todos a fazer o mesmo à espera de resultados diferentes. Imbecilidade, lá está." Alguém informe o senhor que se enganou. Eles não estão à espera de resultados diferentes. Eles estão todos, aliás, a trabalhar para o mesmo, numa guerra de audiências em que o que não faz o programa perde. Vão mudando as pessoas, o moderador, o formato, o cenário, mas se não houver o grupo de representantes dos "três grandes" a discutir à bruta a maioria muda de canal para o programa do costume, não será?
"A cultura, por exemplo, está cheia de imbecis muito eruditos: gente que sabe tudo o que se fez e por isso insiste em fazer, premiar e aplaudir o que se faz como sempre se fez." Não sendo eu conhecedor que chegue da cultura portuguesa para poder avalia-la como merece, basta-me lembrar esta excelência que temos tido prémios literários a autores estreantes e desempregados, temos vozes novas originais como o Gonçalo M. Tavares ou o Afonso Cruz a fazer sucesso e a serem reconhecidos pelos parceiros da cultura, ao mesmo tempo que somos reconhecidos lá fora por gente como o Saramago. A nossa actividade cultural tem muito que andar? Tem. Agora diminui-la a um conjunto de imbecis que se repetem a si próprios é sinal de pura ignorância.
"E estão no povo que, desde há 40 anos, alternadamente vota PS e PSD e espera resultados diferentes." Sinto que foi aqui, quase no fim, que a mensagem do texto se revelou. Mas será que os portugueses são mesmo imbecis? Será só uma imbecilidade que os impele a votar ciclicamente nos mesmos dois partidos? Ou serão outras questões, por demais complexas para serem cuspidas num texto escrito em cima do joelho à sexta-feira?
Afinal não. Afinal voltamos ao tema do título e é aqui que está o fulcro da questão: o Bidarra quer gozar com o Rui Tavares. No final do texto o Pedro Bidarra informa-nos que o Rui Tavares perdeu a virgindade, porque, tal qual adolescente, descobriu a vida real, descobriu que os portugueses políticos e mediáticos (que antes eram imbecis) não ligam nada às europeias que, segundo o próprio, são aquilo que o Rui Tavares e o LIVRE, pelo qual é candidato, precisam para existir. Não percebeu, quiçá, que o problema é muito maior que o Rui Tavares não ser eleito ou o LIVRE ter que esperar pelo próximo acto eleitoral para ganhar notoriedade ou implantação no eleitorado. O problema aqui, goste-se ou não das ideias do Rui Tavares, é que nisto ele tem mesmo razão: a falta de atenção às europeias é que é a verdadeira imbecilidade. Porque os políticos e os media sabem muito bem a importância do que se vai decidir agora para todos nós, só que têm neste momento outros interesses e não estão minimamente preocupados em fazer "serviço público". Complementa este gozo com uma critica ao LIVRE. Pergunta o Bidarra se o dito partido não será mais do mesmo. Mas depois diz que o LIVRE "ainda não lhe chegou".
"Talvez porque os seus gestos e propostas sejam o mesmo de sempre. Talvez porque falem para os mesmos de sempre. Ou talvez porque a sua maneira de comunicar seja a mesma de sempre: convencional e imbecil – no sentido einsteiniano, claro." Ora, notam-se aqui duas coisas que finalmente são de facto importantes em toda esta imbecilidade. A primeira é que este senhor acaba de demonstrar que não sabe mesmo nada do LIVRE, se acha que o partido que organizou as primeiras primárias abertas de Portugal e que permite o acesso a processos de decisão política a apoiantes não membros não está a fazer nada de diferente. A segunda é que este senhor demonstra aqui mais uma imbecilidade, esta sim, que talvez se relacione com tudo o resto: a passividade. Se calhar é por este senhor (e tantos outros em Portugal) ser tão passivo que desconhece o que se passa de inovador no nosso país, na nossa cultura e até mesmo no LIVRE. Enquanto continuarmos com esta mania de que as coisas têm que chegar a nós, mesmo aquelas que são do nosso interesse (como é o caso dos agentes políticos), não vamos sair da "mesmocracia".

Saturday, 3 May 2014

Manifesto

Como aqueles que me conhecem e os que seguem este blog ou a minha presença nas redes sociais sabem, a minha preocupação política tem vindo em constante crescendo, tanto ao nível do que sigo (na TV, na rádio, na net) como ao nível do que comento. Apesar disso, até recentemente, nunca senti a proximidade necessária a um partido específico para me tornar seu militante. Esta situação mudou com o aparecimento do LIVRE. São três as principais razões que causam esta mudança e que decidi partilhar com quem lê este espaço, não só porque gosto de ser claro quando apoio um projecto, como porque talvez se tornem motivos para vocês mesmos irem conhecê-lo.

Aquilo que primeiro me chamou à atenção no LIVRE foi a sua organização e política interna. Um partido não abraça verdadeiramente a transparência e a colaboração com a sociedade civil se o seu próprio funcionamento for fechado, obtuso ou feito em bastidores. O LIVRE tornou-se diferente logo à partida, ao tornar públicas as suas reuniões e processos de deliberação política, mas também ao permitir a participação na sua elaboração de apoiantes. Sendo assim, aqueles que se identifiquem com o partido, ainda que não membros, podem participar em tudo excepto na votação daquilo que diz respeito aos regulamentos internos do LIVRE. Pude sentir o efeito extraordinário deste aparente detalhe no congresso fundador, onde gente não militante, como eu próprio, puderam ajudar a definir politicamente o caminho do partido, de certa forma fazendo-o e, por isso mesmo, criando uma estrutura na qual pudessem votar mais tarde. O outro pilar desta questão é a existência de primárias abertas. Entretanto já realizadas, é para mim incomparavelmente melhor ver uma lista que foi construída de raiz por membros, apoiantes e independentes que se candidataram e foram submetidos a sufrágio, do que vê-la aparecer criada pela direcção do partido. Isto não só porque é um passo para afastar a política do controlo dos aparelhos partidários e dos interesses e troca de favores, mas também porque se torna mais transparente e mais ao gosto não do líder ou da direcção mas daqueles que de facto pretendem mais tarde elege-los para seus representantes.

Por outro lado tenho obrigatoriamente que falar de ideologia política. Só um partido progressista e de esquerda me poderia convencer, a minha visão do que quero para a civilização humana não se coaduna com conservadorismos nem com a direita. Aquilo que o LIVRE me traz, para além de se localizar "no meio da esquerda" onde frequentemente eu próprio me sinto, é uma atitude diferente de base. Assume-se como ecologista e europeísta, tanto como progressista e esquerdista. Isto é importante para mim porque permite ter confiança nos pilares base do partido, saber que a ideia de sociedade que estes pilares implicam se sobrepõe bastante à a minha. Por um lado, porque não me interessa a ecologia como principio único do partido, interessa-me, como aliás se discutiu no congresso fundador, que todas as medidas, sejam em que área for, passem por uma consideração de efeito a nível ambiental - não faz sentido deixar a ecologia como um nicho onde se vai comprar apoios com meia-dúzia de medidas que "lhes interessem", a ecologia tem que ser um princípio geral. O europeísmo aqui é importante a dois níveis: a vontade de progredir na União Europeia e a vontade de a mudar. A vontade de aumentar a integração europeia coaduna-se com a minha opinião de que só se poderá ter uma política socialista de longo prazo quando ela for obtida no máximo de locais possível. Não vejo futuro no isolamento nem em rodearmo-nos de uma Europa capitalista e neoliberal. A vontade de mudar a UE é uma necessidade que é hoje óbvia pelo menos para os países atingidos pelos troikismos recentes. Precisamos de uma UE mais democrática, mais dependente do voto do cidadão e com responsabilização perante este, de forma a fugirmos à tendência para criar uma simples máquina burocrática que dê seguimento aos decretos dos países mais poderosos da união, como tem ocorrido até agora e em especial agora.

O terceiro ponto que me atrai no LIVRE é a sua vontade de convergir. Estou farto de uma esquerda partida em bocados que lutam tanto para ser a "verdadeira esquerda" ou a "esquerda realista" que se deixam constantemente rodear por uma direita que tem tido, admita-se, mais vontade de se entender ou pelo menos menos pruridos em deixar cair algumas das suas ideias para poder governar. Se a esquerda portuguesa não mudar, vai continuar a defender as coisas certas mas sempre na oposição, lutando tanto com a direita como entre os seus vários sub-grupos. Podemos aqui, claro, ponderar onde recai a responsabilidade deste sectarismo. Na história? Será ela tão intransponível? No PS, que com medo de perder a sua aparência de realismo, de "arco da governabilidade", de "centrão", raramente se entende à esquerda (às vezes nem com a esquerda interna)? No PCP e no BE, que vivem no parlamento a definir-se como a "verdadeira esquerda" por oposição ao PS e prontamente o empurram para esse mesmo "centrão" do qual o acusam diariamente? Será que se deve a uma tão forte ligação à sua ideologia, que nenhum grupo está capaz de ceder numa coisa que seja para conseguir arrastar a governação portuguesa para a esquerda, mesmo que não seja exactamente para a esquerda que sonham? O LIVRE, por estar no meio da esquerda mas essencialmente por assumir esse princípio de querer procurar entendimentos com outros partidos, pode ser uma ponte ou até uma força em si mesmo para gerar este governo. Seja em coligação com o PS, que tem tido a maioria dos votos da ala esquerda do parlamento, seja com o BE, ou até mesmo com ambos, há aqui o potencial de ultrapassar diferenças e governar Portugal, talvez não exactamente de acordo com os princípios de cada partido, mas decerto muito mais próximos disso do que em qualquer legislatura anterior.

Foi isto que me chamou ao LIVRE, e foi por isto que me fiz apoiante. Mais tarde, foi por isto, pelo encorajamento de alguns membros e por achar que tinha algo a oferecer que me candidatei às primárias para as eleições europeias. Olhando para trás, é com orgulho que digo que participei nas primeiras primárias abertas da nossa democracia e que trouxe ideias próprias para actuação no Parlamento Europeu, minhas, diferentes das de outros candidatos mas de acordo, claramente, com os princípios gerais e o programa aprovado pelo partido para as europeias. Perdi as eleições, no sentido em que não faço parte da lista, mas ganhei, não só pela participação mas também porque algumas das pessoas de que apoiei durante o processo das primárias acabaram eleitas e até mesmo no top 6. O resultado das primárias está à vista, os seis mais votados incluem um eurodeputado e gente que nunca teve cargos políticos, membros e independentes, gente que vive cá e gente que emigrou, candidatos que se revêem nos verdes europeus e candidatos que se revêem nos socialistas europeus. Se antes queria votar por gostar do partido e do seu programa, agora quero votar LIVRE também por conhecer os seus candidatos e ter ajudado a fazer deles candidatos, por querer algumas destas pessoas a representar Portugal no PE.

Resta-me, por fim, abordar uma última questão. Se o partido me convenceu de tal forma, porque sou apenas apoiante? Porque não me fiz membro oficial do LIVRE? Inicialmente, pela minha reticência em ser "militante" de uma estrutura que não depende do meu controlo mas que ficará associada a mim eternamente. Talvez também por alguma reticência em ser considerado "político". Talvez ainda por o projecto ser tão recente que não é fácil entregar-me a ele de tal forma.
Mas agora? Porque ainda não sou membro do LIVRE? Porque estou à espera da oficialização. Estou a tratar disso, porque, ultrapassadas as reticências acima, quero não só ajudar construir o LIVRE como obrigar-me a ser responsável por ele, na medida em que qualquer membro o é.

Convido-vos a visitar o LIVRE, a conhecer os documentos, os princípios, a organização, o programa político para as europeias. E, se concordarem, juntem-se a mim.